Por Paulo Sergio João*
Foram destaque na mĂdia as manifestações do ministro FlĂĄvio Dino em torno da terceirização e "pejotização", por ocasião do julgamento da Reclamação Constitucional. InegĂĄvel que são modelos de prestação de serviços que hĂĄ muito tempo vĂȘm criando confusão nos seus conceitos mesmo entre juristas. Mas no conceito o ministro terceirização e a "pejotização", são expressões com caracterĂsticas pejorativas e que insinua, pela caricatura que faz, mal uso jurĂdico da contratação de serviços. Pessoalmente, acho a expressão horrorosa e tendenciosa, utilizada em geral por quem tem preconceito no modelo de contratação.
Afirmou o ministro que o trabalhador que estĂĄ vinculado à terceirização tem condição melhor que aquele da pessoa jurĂdica porque Ă© empregado da empresa prestadora de serviços e tem seus direitos trabalhistas e previdenciĂĄrios reconhecidos. Mas, diriam alguns, a dignidade da pessoa humana estaria prejudicada. Talvez fosse mais adequada uma crĂtica severa à terceirização que precariza e funciona como instrumento de exclusão de direitos, fruto de um sindicalismo de categoria que insiste no tratamento separatista de trabalhadores.
Ao se referir ao que chamou de "pejotização", afirmou Sua ExcelĂȘncia que o trabalhador, nestas condições, não teria direito à aposentadoria e que, em caso de acidente ou gravidez, estaria desamparado. Supôs o ministro que o vĂnculo de emprego Ă© a Ășnica forma de assegurar, nos momentos de incapacidade laboral, direitos aos trabalhadores. Não Ă© verdade! Os perĂodos de emprego não são contĂnuos e, com frequĂȘncia, paira a ameaça do desemprego, o que torna a aposentadoria uma desesperança e uma conquista de poucos.
Ă certo que o sistema de previdĂȘncia social, desde sua criação, baseou-se exclusivamente na folha de pagamento de salĂĄrios como forma de obtenção de fonte de custeio dos benefĂcios que oferecia aos segurados, especialmente assalariados.
A previdĂȘncia social era o regime de seguro dos assalariados. Todavia, ao longo dos anos, caminhando para um modelo de seguridade social, a previdĂȘncia teve seu campo de aplicação e sua base de proteção ampliadas para outros benefĂcios e tipos de trabalhadores tais como avulsos, autônomos, rurais, domĂ©sticos, incluindo sócios de empresas.
Deixaram de avisar o ministro que o trabalhador, titular da pessoa jurĂdica, pela qual presta serviços, tambĂ©m recolhe, como segurado obrigatório, para os cofres da previdĂȘncia social e que, deste modo, poderĂĄ obter a aposentadoria, preenchidos os requisitos de idade, tempo de serviço e contribuição para o sistema.
Da mesma forma, o trabalhador titular da empresa poderĂĄ, em caso de acidente ou doença, beneficiar-se de auxĂlio-doença, calculado com base no recolhimento que estiver enquadrado na previdĂȘncia social.
Igualmente, se for titular da empresa uma mulher e se for gestante, tambĂ©m vai se beneficiar da licença e terĂĄ o perĂodo de salĂĄrio maternidade pagos pela previdĂȘncia social. AliĂĄs o STF publicou decisão da corte no sentido de excluir a carĂȘncia para autônoma receber salĂĄrio-maternidade.
Finalmente, parece que o STF estĂĄ sendo invadido por informações equivocadas e simplistas, de raciocĂnio pouco jurĂdico, de saudosistas e oportunistas apegados a um modelo de relação de trabalho que jĂĄ Ă© passado. O vĂnculo de emprego não Ă© a Ășnica forma de proteção social como se viu, nem o modelo de contrato de trabalho por meio de pessoa jurĂdica ameaça as finanças da previdĂȘncia social, cujos benefĂcios encontram-se devidamente cobertos por forma de custeio definido em lei.
(*) Advogado e professor de Direito Trabalhista da PontifĂcia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).