O Comitê de Política Monetária do Banco Central (o Copom) elevou mais uma vez a nossa taxa básica de juros (a taxa Selic), para 14,75% ao ano - em linha com a sinalização da última reunião.
Os motivos por trás da elevação da Selic vieram principalmente do palco doméstico, diante de uma economia aquecida, inflação acima da meta e incertezas fiscais persistentes. O ambiente externo também influenciou a decisão, contribuindo para o tom cauteloso do comitê, diante de receios de uma desaceleração global, fruto de incertezas derivadas a política comercial americana.
Acreditamos que o Banco Central deverá manter a política monetária em nível contracionista ao longo dos próximos meses, com a Selic próxima a 15%. Diante da elevada incerteza tanto no cenário doméstico, quanto no global, entendemos que um potencial ciclo de baixas da taxa Selic segue distante.
Incertezas no cenário global
No documento de hoje, o Comitê destacou que o ambiente internacional se tornou ainda mais desafiador diante da conjuntura e da política econômica nos Estados Unidos. Enquanto, na reunião anterior, a grande preocupação eram os efeitos inflacionários das políticas sinalizadas por Donald Trump, um cenário de recessão na maior economia do mundo se tornou um dos principais riscos.
Vale destacar: é verdade que aumento de tarifas de importação tende a ter efeitos inflacionários no curto e médio prazo - uma vez que produtos importados ficam mais caros, e a regionalização da produção também tende a elevar os preços (por custos mais altos, especialmente de mão de obra).
Porém, dado o nível de incerteza gerado pelo "vai e vem" recente da política tarifária de Donald Trump e os impactos sobre os níveis de confiança e credibilidade da economia americana, receios de que o país entre em recessão tornaram-se mais relevantes.
Deste modo, o que antes eram receios de que a inflação global pressionasse os preços aqui no Brasil, se tornaram um risco de que nossa economia cresça menos que o esperado, o que reduziria a necessidade de juros mais alto para controlar a inflação em nosso país.
Na mesma linha, um mundo que cresce menos tende a demandar menos insumos básicos, o que pode se traduzir em preços de commodities (como minério de ferro e petróleo) mais baixos e, consequentemente, pressões desinflacionárias.
Economia doméstica segue aquecida
Aqui no Brasil, o Comitê seguiu indicando a resiliência da economia - com destaque para o mercado de trabalho - como fonte de pressão sobre os preços, apesar de sinais iniciais de moderação no crescimento econômico nos últimos meses.
Vale lembrar que: um mercado de trabalho aquecido tende a pressionar os salários, dado o maior "poder de barganha" de trabalhadores e a busca por mão de obra. Com maiores salários e grande parte da população empregada, aumenta-se a demanda por bens e serviços na economia - e o movimento de alta de preços ganha força, retroalimentando-se.
Como destacado pelo Copom, o aquecimento do mercado de trabalho, a robustez da economia e as expectativas sobre a inflação no futuro ainda desancoradas demandam uma posição mais cautelosa no controle dos preços adiante.
O risco fiscal não foi esquecido
O comunicado que acompanhou a decisão também manteve o tom duro sobre o risco fiscal. O Comitê destacou que o contexto das contas públicas segue prejudicando a percepção de risco de investidores em relação aos ativos financeiros brasileiros - o famoso "risco fiscal". Esse piora, por sua vez, impacta diretamente ativos brasileiros, como títulos de renda fixa, nossa moeda e ações - além das expectativas sobre a inflação no futuro.
Deste modo, apesar da recente valorização do Real - que reflete muito mais o enfraquecimento do dólar no mundo, do que uma melhora no ambiente doméstico - a percepção de risco país segue fator central para o controle de preços adiante.
A decisão
O Copom optou por elevar a Selic em 0,50 ponto percentual, para 14,75% ao ano, dando continuidade ao ciclo de alta de juros iniciado em setembro de 2024.
Acreditamos que o Banco Central deverá manter a taxa Selic em patamar contracionista, próximo a 15,00%, até ao menos o fim desse ano. Nesse nível, o objetivo é a desaceleração da economia - tornando o crédito mais caro, desincentivando o consumo, incentivando o investimento e, assim, reduzindo a demanda por bens e serviços e reduzindo a pressão sobre os preços.
Mas os juros não devem seguir para sempre em alta
A elevação dos juros pode ser vista como um "remédio amargo, porém necessário, para conter uma doença ainda pior: a inflação".
Nesse contexto, embora projetemos que a Selic siga em patamar elevado nos próximos meses, a nossa taxa básica de juros não deverá seguir em nível contracionista de maneira permanente.
Diante dos desafios do cenário inflacionário doméstico, não vemos o início de um ciclo de corte de juros tão cedo. Dito isso, acreditamos que o Copom poderá encontrar espaço para um início de corte de juros em meados de 2026, mesmo que gradual. Isso se o "remédio" tiver surtido seu efeito até lá.
Vou sentir a alta dos de juros?
Para o dia a dia do brasileiro, pouca coisa muda com a elevação da Selic para 14,75% especialmente no curto prazo.
Isso porque mudanças na taxa básica de juros demoram a ser sentidas na economia - chamamos esse efeito de "defasagem da política monetária". No Brasil, o intervalo para que alterações na Selic sejam refletidas nas taxas para empresas e pessoas física varia de 3 a 12 meses.
Vale lembrar: a política monetária opera com defasagem, fazendo com que o Banco Central sempre mire o que chamamos de "horizonte relevante de política monetária". Em outras palavras, como os efeitos da taxa Selic demoram a ser sentidos na economia, o objetivo de trazer a inflação para a meta sempre irá considerar as projeções da inflação no futuro - e não necessariamente a inflação que vemos hoje.
Além disso, o impacto também varia de acordo com a modalidade do crédito. Por exemplo, a variação de 1p.p. na taxa Selic leva a uma variação quatro vezes maior nos juros médios do cheque especial ao longo de doze meses (conforme estudo do Banco Central). Já outros tipos de crédito, como o imobiliário e para veículos, são impactados em um período de 6 e 3 meses em média, respectivamente.
Assim, a sensação de aperto das condições financeiras deve ganhar força gradualmente, especialmente na segunda metade desse ano.
Renda fixa segue atrativa
Diante da elevação da taxa de juros no patamar contracionista, a renda fixa brasileira segue atrativa - garantindo retornos elevados para investimentos pós fixados e reserva de emergência.
Além disso, diante de um cenário onde a inflação segue um risco no longo prazo, títulos de renda fixa atrelados à índices de preço seguem uma excelente proteção para seus investimentos - dando espaço para vencimentos mais longos, com prazo médio de seis anos.
Para os pré-fixados, o último mês foi marcado pela redução das taxas observadas incorporando uma menor percepção do risco fiscal. Para essa classe, mantemos nossa recomendação para pré-fixados e bastante cautelosa, priorizando vencimentos de curto prazo (1,5-2 anos) e oportunidades pontuais em títulos privados.
Dito isso, o momento segue propício por um bom equilíbrio entre os diferentes indexadores na carteira do investidor.
Selic em alta pede cautela, mas não o fim da diversificação na bolsa
Independente da taxa Selic em patamar elevado, a diversificação dos investimentos segue a melhor amiga de bons retornos no longo prazo. Além disso, vale destacar que seguimos vendo a bolsa brasileira como barata (comparada ao histórico recente e a pares emergentes), e uma frente de oportunidades para investidores com horizonte de longo prazo.
Dito isso, o cenário de juros altos por mais tempo contribui para um ambiente mais desafiador para empresas - e assim, investimentos na bolsa.
Essa dinâmica é sentida principalmente por ações mais sensíveis aos movimentos dos juros, como as cíclicas (ou seja, de empresas que atuam em setores que refletem de maneira mais clara o "sobe e desce" da economia) e com maior nível de alavancagem - em bom português, com maiores dívidas.
Nesse contexto, seguimos com nossa recomendação de manter um bom "filtro" para a escolha das empresas, buscando companhias com balanços mais sólidos, que possuam maior qualidade em seu negócio, e que possam oferecer resiliência em meio ao cenário doméstico ainda desafiador.