Por Raquel Fabiana Câmara Grieco*
A discriminação racial é, infelizmente, um dos maiores males sociais que ainda afeta o Brasil, refletindo em diversos aspectos da vida cotidiana de milhões de cidadãos. Entre janeiro e novembro de 2024, o Disque 100 recebeu mais de 3,4 mil denúncias que abrangem mais de 5,2 mil violações de cunho racial. Dados alarmantes que evidenciam a persistência desse mal, que se manifesta em variados ambientes, como residências, instituições de ensino e, cada vez mais, no espaço virtual. Vale salientar, ainda, o aumento de 64% no número de processos relacionados a crimes de racismo - também no ano de 2024 - reflete uma realidade ainda urgente: a necessidade de um debate contínuo e profundo sobre a discriminação racial no país.
Essa realidade é um reflexo de estruturas históricas e sociais que, desde o período colonial, marginalizam grupos com base na cor da pele ou origem étnica. Seus efeitos se estendem por séculos, moldando as relações sociais, o acesso à educação, as oportunidades no mercado de trabalho e a atuação da segurança pública, afetando, de maneira desigual, a população negra e outras minorias.
Injúria racial e racismo: diferenças e aspectos legais
No Brasil, dois termos frequentemente causam confusão, mas possuem significados e implicações legais distintas: injúria racial e racismo. A injúria racial ocorre quando uma pessoa ofende outra com base na raça ou etnia, utilizando palavras ou gestos que diminuem a dignidade do ofendido. Essa prática é considerada um crime, e o infrator pode ser punido com pena de reclusão de 1 a 3 anos, além de multa, conforme o artigo 140, §3º, do Código Penal. Vale destacar que, no caso da injúria racial, a ofensa não precisa ser dirigida a um grupo, mas sim a uma pessoa específica, em uma situação de interação direta.
Por outro lado, o racismo é caracterizado por práticas discriminatórias que envolvem a exclusão ou a segregação de grupos étnicos ou raciais. O racismo é um crime mais grave e abrange atitudes que buscam estabelecer uma distinção racial em diferentes esferas da sociedade, como no mercado de trabalho, nas escolas e no sistema de justiça. Ele está previsto na Lei nº 7.716/89, que pune a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional, com pena de reclusão de 1 a 3 anos, e pode ser ampliado em situações mais graves.
O que é crime no Brasil hoje?
A Constituição Brasileira de 1988, em seu artigo 5º, assegura a igualdade de todos perante a lei, sem distinção de qualquer natureza. A partir dessa base constitucional, o Brasil criou diversas legislações para combater a discriminação racial, estabelecendo penas e punições para quem comete atos discriminatórios.
Em relação ao racismo, a Lei nº 7.716/1989 tipifica como crime atos de discriminação racial, incluindo impedir ou dificultar o acesso a determinados direitos e serviços em razão da cor ou etnia. O racismo, portanto, não pode ser visto apenas como uma questão de atitude isolada, mas como um sistema de opressão que precisa ser combatido em todas as suas formas.
Alem disso, a Lei Caó, sancionada em 1989, trata da criminalização do racismo no Brasil, tipificando como crime a discriminação em razão de raça, cor, etnia ou religião, e estabelecendo penas de reclusão para os infratores. É importante frisar que o racismo no Brasil é imprescritível e inafiançável, ou seja, a pessoa acusada de racismo não pode ser liberada mediante pagamento de fiança, e o crime pode ser julgado a qualquer tempo, independentemente do período decorrido.
A necessidade de conscientização e ação
O combate à discriminação racial exige mais do que a simples aplicação das leis. Ele demanda uma mudança cultural profunda, que envolve o respeito à diversidade, o combate aos estereótipos e a promoção da inclusão social. As instituições de ensino, o mercado de trabalho, os meios de comunicação e os governos têm papel fundamental na construção de uma sociedade mais igualitária.
No entanto, a legislação sozinha não é suficiente. Precisamos de uma sociedade mais consciente, que entenda o racismo como um problema de todos e não apenas de uma parte da população. A educação, a conscientização e o respeito às diferenças são fundamentais para garantir que as gerações futuras vivam em um país mais justo, onde a discriminação racial seja coisa do passado.
(*) Advogada no escritório Bosquê & Grieco advogados.