Por Juliana Conti*
Essa é uma pergunta que volta e meia escuto, mas que nos últimos dias ecoou com mais força. Fomos surpreendidos com a notícia dolorosa do falecimento de um colega de profissão, um psicólogo de renome, cuja morte por suicídio nos deixou atônitos. Não apenas pelo impacto da perda, mas pelo abalo que ela provoca dentro de nós, profissionais da saúde mental. Afinal, somos aqueles que ouvem, acolhem, orientam. Somos aqueles que "sabem lidar". Mas e quando não conseguimos?
Falar sobre o cuidado com o cuidador é, acima de tudo, falar de humanidade. De reconhecer que, por trás do saber técnico e da escuta atenta, existem pessoas. Pessoas que também sofrem, também enfrentam lutos silenciosos, sobrecargas emocionais, jornadas exaustivas, cobranças internas, inseguranças e dores que, muitas vezes, ficam guardadas onde ninguém vê - nem mesmo quem está acostumado a olhar para dentro.
Nós, psicólogos, carregamos uma responsabilidade imensa: a de sustentar espaços de escuta, de transformação, de alívio e de saúde. E, ao mesmo tempo, enfrentamos os nossos próprios limites. A ideia romantizada de que o terapeuta é sempre equilibrado, blindado, forte - é, em si, um fardo.
É preciso falar sobre isso com seriedade, com empatia, com compromisso. É preciso desmistificar a ideia de que autocuidado é luxo ou vaidade. Cuidar de si, para quem cuida dos outros, é necessidade. É ética. É condição para continuar exercendo nosso trabalho com presença, com afeto e com responsabilidade.
Cuidar do cuidador é criar espaços seguros para troca entre colegas. É respeitar nossos limites. É buscar supervisão, psicoterapia, pausas, rede de apoio. É reconhecer que não estamos sozinhos. Que não precisamos dar conta de tudo - e nem deveríamos.
A notícia que nos abalou nesta semana é também um grito silencioso de alerta. Que ela não seja em vão. Que possamos honrar a memória do colega que se foi com mais escuta, mais cuidado, mais afeto entre nós. Que a dor não seja motivo de vergonha, mas um chamado à solidariedade. Que a saúde mental dos profissionais da saúde mental seja pauta urgente - nas instituições, nas formações, nas redes de apoio, nas nossas rotinas.
Porque, no fim das contas, todos nós somos humanos. E, como humanos, merecemos cuidado.
(*) Psicóloga (CRP-SP 06/139348), Psicanalista, Sexóloga e Professora Universitária.
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